Ao contrário do que se possa pensar, o jornalismo desportivo já não é o que era.
Fazia muito sentido, por exemplo, quando no século passado, era uma das formas de levar com honestidade o espectáculo desportivo a casa das pessoas.
Desses tempos que agora me parecem longínquos, guardo duas imagens que me são gratas.
Tendo eu nascido numa antiga Província Ultramarina, banhada pelo Indíco, de seu nome Moçambique, recordo-me de Lourenço Marques (Maputo), cidade onde nasci em 1963, e de ir no VW 1600 com o meu Pai desde a Avenida 24 de Julho onde morava ao centro da cidade, onde o meu Pai depois de ter "religiosamente" comprado um volume de cigarros GT (fumava 5 maços por dia!!), se sentava para ler na esplanada do SCALA, o seu jornal "a bola" ... do dia anterior (imagine-se), e lembro-me de o ter sempre reservado (o seu jornal narcótico) que comprava e pagava ao mês!!
O meu falecido Pai, daqueles homens distintos em que a honra, honestidade e respeito eram condições essenciais para se andar de cabeça erguida, era um Benfiquista apaixonado.
Fazia ele e o seu Clã do SLB em Lourenço Marques, tudo pelo Benfica (basta que vos diga que o Padrinho da minha Irmã, hoje ainda vivo com 94 anos, de nome Mário Melo, era o dono do talho em Lourenço Marques, que escondeu o Eusébio, enquanto os lagartos procuravam que nem loucos por ele em todos os cantos!), e não gostava de perder pitada da vida do Glorioso no Continente, da sua Lisboa onde tinha nascido em 1930, terra da sua paixão.
Sentava-me ao seu lado, ele mandava vir o seu café e copo de água, um bolo e uma coca-cola para mim, e dispensava-me por vezes, muito a custo, uma página do jornal (nunca a que falava do Benfica), ou então comprava-me uma revista do Mickey quando havia, para eu ficar entretido.
Eu era puto, sentado na cadeira não tocava com os pés no chão e aquilo para mim era o máximo!
Ele, primeiro lia na transversal, avidamente, como que tentando aliviar a sua dependência, o seu vício pelo Benfica. Depois descontraído, lá reparava nos detalhes, nas fotos do Ferrari e conversava com os amigos que se cruzavam. Mexendo o café, dava dois dedos de conversa, invariavelmente o Glorioso vinha à baila.
Às terças, quando o jornal era o de 2ª feira, ai então lia-me a crónica contada, do jogo do Benfica. Lia, dava enfase a certas passagens que repetia, numa altura em que os jornalistas desportivos Vitór Santos, Carlos Pinhão e Aurélio Márcio, escreviam divinalmente pintando com as palavras aquilo que se tinha passado nos relvados durante o fim-de-semana.
Hoje rareiam profissionais assim, e a maioria, por vezes se os personificássemos no Pulitzer, alguns deles localizar-se-iam onde honrosamente as costas mudam de nome.
Não encontro muitas excepções. Há, mas não conseguem ter fieis que procurem as suas crónicas assim que abrem os jornais.
A outra cena que também me recordo, é de África, do jipe Land Rover, do rádio Telefunken, da emissão AM com a transmissão do jogo do Benfica, num Domingo à tarde, no meio duma planície quente e sem fim num fim-de-semana de caçada.
Pousado no capot do jipe, o "Rádio". Concentrados ao seu redor, o meu Pai e os seus cigarros, os amigos e as suas cervejas 2M, os batedores africanos e os seu sorrisos brancos e nós putos, a fazermos tudo o que a liberdade nos dava direito.
O relato era desse enorme Senhor de nome Artur Agostinho, um Sportinguista dos sete costados, que dava vida aos jogos, que fazia Jornalismo Desportivo com as suas palavras e descrições fantásticas carregadas de emoção.
Por segundos o tempo parava. Quando ele gritava «Goooooooooooooooolo do Eusébiiiiiio!» nós putos parávamos de cabriolar, como que congelados por aquele momentos em que víamos a alegria estampada no rosto dos mais velhos, que por escape imediatamente era o caos, os gritos,os abraços e as Mães, tias e filhas a dizerem ... «baixem lá isso que nos pregaram um susto!».
Este era o outro tipo de jornalismo desportivo que se fazia com classe.
Hoje é diferente. A época, o estilo e a maledicência tomou conta desta vertente do Jornalismo.
Resta-nos o advento da Internet, da Televisão e da tecla «mute», abençoada seja!
Raramente compro um jornal desportivo, por vezes leio online, mas mais rapidamente encontro as notícias "googlando", do que eles as dão, aquelas redacções são uma lanzeira.
Assim é o Jornalismo desportivo agora. Este jornalismo de encomenda traduz-se num jornal o Jogo, mimosamente denominado por «o nojo», onde o seu Pato "Tavares-Teles" -repara Alex Pais! - ganhou uma acção em tribunal ao Vieira, com uma indemnização simbólica de 1€, mas que o Youtube no dia seguinte, provou mais tarde o jornalismo de encomenda que ele afirmava nunca ter feito. Azar que se pode rever aqui! Também o Pato nunca foi acusado de nada pelos Tribunais... coincidências.
Traduz-se num jornal Record, jocosamente chamado de «Rascord» capaz das sua capas ordinaritas e de algum sensacionalismo laxativo, com um Alexandre Pais, que é do que mais tristonho o jornalismo lusitano viu nascer. Eugénio Queirós é passar adiante.
Depois o famoso jornal A bola, denominado de «o esférico» por onde pupulam "canetas de aluguer", que já nem vergonha na cara têm, nem escondem, a defesa dos interesses de quem aos comandos do Benfica, os vai ... qualquer coisa, senão ainda levo com um processo em cima.
O jornalista Delgado, é algo de degradante, ao ponto de antes de ler uma crónica ver sempre quem a escreve. Sendo dele, passo à frente.
E esse Vitor Serpa, que vestiu-se de "lápis azul" naquele episódio com o Zé Quintela (um Artur Agostinho em grandeza no que a Sportinguismo ainda encontramos) e que o Ricardo Araújo Pereira, resolveu tão bem.
Amigos não têm cor clubística!
Abraço
P.S. Em relação a "dias seguintes", "Rui Santos Live" e outros programas desses, é mudar para a National Geographic.
Fazia muito sentido, por exemplo, quando no século passado, era uma das formas de levar com honestidade o espectáculo desportivo a casa das pessoas.
Desses tempos que agora me parecem longínquos, guardo duas imagens que me são gratas.
Tendo eu nascido numa antiga Província Ultramarina, banhada pelo Indíco, de seu nome Moçambique, recordo-me de Lourenço Marques (Maputo), cidade onde nasci em 1963, e de ir no VW 1600 com o meu Pai desde a Avenida 24 de Julho onde morava ao centro da cidade, onde o meu Pai depois de ter "religiosamente" comprado um volume de cigarros GT (fumava 5 maços por dia!!), se sentava para ler na esplanada do SCALA, o seu jornal "a bola" ... do dia anterior (imagine-se), e lembro-me de o ter sempre reservado (o seu jornal narcótico) que comprava e pagava ao mês!!
O meu falecido Pai, daqueles homens distintos em que a honra, honestidade e respeito eram condições essenciais para se andar de cabeça erguida, era um Benfiquista apaixonado.
Fazia ele e o seu Clã do SLB em Lourenço Marques, tudo pelo Benfica (basta que vos diga que o Padrinho da minha Irmã, hoje ainda vivo com 94 anos, de nome Mário Melo, era o dono do talho em Lourenço Marques, que escondeu o Eusébio, enquanto os lagartos procuravam que nem loucos por ele em todos os cantos!), e não gostava de perder pitada da vida do Glorioso no Continente, da sua Lisboa onde tinha nascido em 1930, terra da sua paixão.
Sentava-me ao seu lado, ele mandava vir o seu café e copo de água, um bolo e uma coca-cola para mim, e dispensava-me por vezes, muito a custo, uma página do jornal (nunca a que falava do Benfica), ou então comprava-me uma revista do Mickey quando havia, para eu ficar entretido.
Eu era puto, sentado na cadeira não tocava com os pés no chão e aquilo para mim era o máximo!
Ele, primeiro lia na transversal, avidamente, como que tentando aliviar a sua dependência, o seu vício pelo Benfica. Depois descontraído, lá reparava nos detalhes, nas fotos do Ferrari e conversava com os amigos que se cruzavam. Mexendo o café, dava dois dedos de conversa, invariavelmente o Glorioso vinha à baila.
Às terças, quando o jornal era o de 2ª feira, ai então lia-me a crónica contada, do jogo do Benfica. Lia, dava enfase a certas passagens que repetia, numa altura em que os jornalistas desportivos Vitór Santos, Carlos Pinhão e Aurélio Márcio, escreviam divinalmente pintando com as palavras aquilo que se tinha passado nos relvados durante o fim-de-semana.
Hoje rareiam profissionais assim, e a maioria, por vezes se os personificássemos no Pulitzer, alguns deles localizar-se-iam onde honrosamente as costas mudam de nome.
Não encontro muitas excepções. Há, mas não conseguem ter fieis que procurem as suas crónicas assim que abrem os jornais.
A outra cena que também me recordo, é de África, do jipe Land Rover, do rádio Telefunken, da emissão AM com a transmissão do jogo do Benfica, num Domingo à tarde, no meio duma planície quente e sem fim num fim-de-semana de caçada.
Pousado no capot do jipe, o "Rádio". Concentrados ao seu redor, o meu Pai e os seus cigarros, os amigos e as suas cervejas 2M, os batedores africanos e os seu sorrisos brancos e nós putos, a fazermos tudo o que a liberdade nos dava direito.
O relato era desse enorme Senhor de nome Artur Agostinho, um Sportinguista dos sete costados, que dava vida aos jogos, que fazia Jornalismo Desportivo com as suas palavras e descrições fantásticas carregadas de emoção.
Por segundos o tempo parava. Quando ele gritava «Goooooooooooooooolo do Eusébiiiiiio!» nós putos parávamos de cabriolar, como que congelados por aquele momentos em que víamos a alegria estampada no rosto dos mais velhos, que por escape imediatamente era o caos, os gritos,os abraços e as Mães, tias e filhas a dizerem ... «baixem lá isso que nos pregaram um susto!».
Este era o outro tipo de jornalismo desportivo que se fazia com classe.
Hoje é diferente. A época, o estilo e a maledicência tomou conta desta vertente do Jornalismo.
Resta-nos o advento da Internet, da Televisão e da tecla «mute», abençoada seja!
Raramente compro um jornal desportivo, por vezes leio online, mas mais rapidamente encontro as notícias "googlando", do que eles as dão, aquelas redacções são uma lanzeira.
Assim é o Jornalismo desportivo agora. Este jornalismo de encomenda traduz-se num jornal o Jogo, mimosamente denominado por «o nojo», onde o seu Pato "Tavares-Teles" -repara Alex Pais! - ganhou uma acção em tribunal ao Vieira, com uma indemnização simbólica de 1€, mas que o Youtube no dia seguinte, provou mais tarde o jornalismo de encomenda que ele afirmava nunca ter feito. Azar que se pode rever aqui! Também o Pato nunca foi acusado de nada pelos Tribunais... coincidências.
Traduz-se num jornal Record, jocosamente chamado de «Rascord» capaz das sua capas ordinaritas e de algum sensacionalismo laxativo, com um Alexandre Pais, que é do que mais tristonho o jornalismo lusitano viu nascer. Eugénio Queirós é passar adiante.
Depois o famoso jornal A bola, denominado de «o esférico» por onde pupulam "canetas de aluguer", que já nem vergonha na cara têm, nem escondem, a defesa dos interesses de quem aos comandos do Benfica, os vai ... qualquer coisa, senão ainda levo com um processo em cima.
O jornalista Delgado, é algo de degradante, ao ponto de antes de ler uma crónica ver sempre quem a escreve. Sendo dele, passo à frente.
E esse Vitor Serpa, que vestiu-se de "lápis azul" naquele episódio com o Zé Quintela (um Artur Agostinho em grandeza no que a Sportinguismo ainda encontramos) e que o Ricardo Araújo Pereira, resolveu tão bem.
Amigos não têm cor clubística!
Abraço
P.S. Em relação a "dias seguintes", "Rui Santos Live" e outros programas desses, é mudar para a National Geographic.
12 comentários:
Qualquer retornado lê a primeira parte do seu texto e fica emocionado, também vivi experiência parecida e e não contive uma lágrima.
Saudades de África amiga
Boas, finalmente leio na net uma referência o Sport Lourenço Marques e Benfica, hoje Costa do Sol, clube onde meu pai foi dirigente e seccionista e onde fui atleta no basquetebol.
Saudade imensa...
Quanto às memórias que referes são muito idênticas às minhas, o jornal A Bola só abandonava o sovaco de meu pai depois de lida e relida e lembro-me também das tardes de futebol no campo do SLMB ouvindo o relato do glorioso.
Nos dias de hoje há muito que não leio esses pasquins repletos de junta-letras avençados.
Falam da advocacia esquecem-se da fossa que é o Jornalismo! Há bons jornalistas, que infelizmente não podem lutar contra a corrente.
O Jornalista é cada vez mais um pássaro engaiolado.
Abraço a todos os que vieram da Terra do grande Eusébio. Mesmo tão longe sempre se sentiu muito o Benfica, assim como hoje ainda o sentem.
Maputo é uma cidade linda, um pouco devastada mas que vai ressurgir. E tem algo enorme. Um povo fantástico, meus irmãos que me deixam sempre com saudades.
Abraço
Tremendo testemunho! À BENFICA!
Um abraço do tamanho do mundo
Revejo-me neste post. Também vivi em Maputo e isso tudo é verdade no que se refere a A Bola.
Falou-se também aqui num comentário do S.L.M. e Benfica/Costa do Sol onde joguei e fui dirigente.
Abraço.
Muito bonito o texto, a relembrar o poder que o Benfica tinha nas colónias portuguesas.
Manuel Oliveira, pelos vistos também és Coca-cola. Um Abraço para ti e Kanimambo!
Papoila, não sou coca-cola, sou açoriano, mas fui para lá com 5 anos!
Abraço.
Manuel Oliveira, é quase a mesma coisa. Abraço
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